Por Vilma Soares
Com a chegada da pandemia, as escolas tiveram que se reinventar para atender seus estudantes. E não foi diferente na escola onde atuo. A princípio, pensei que o período seria breve, mas com o passar do tempo, fui percebendo que precisava pensar em práticas novas, considerando diferentes tecnologias e ferramentas para atender todos os estudantes, entre eles um aluno com TEA (Transtorno do Espectro Autista).
Acredito que até 2020 não havíamos tido uma educação que priorizasse a autonomia dos estudantes e nem que utilizasse a cultura digital como ferramenta permanente de estudo. Com isso, houve a necessidade de realizar muitos momentos de pesquisa para que a inclusão fosse garantida de fato em tempos de pandemia.
A forma como as aulas remotas estavam sendo realizadas não se mostrava suficiente para atender às necessidades do único aluno autista da turma. Foi então que resolvi preparar uma metodologia que pudesse chegar ao lar do estudante, tanto de forma virtual quanto presencial. Com atividades remotas e diversificadas, planejei inserir a cultura digital para promover o engajamento familiar e a valorização das relações humanas.
Percebi que as desigualdades sociais foram reforçadas ainda mais durante o ensino remoto. Assim, para diminuir esses impactos e eliminar barreiras, montei uma caixa com materiais reciclados, como tampinhas, palitos de picolé, blocos de montar entre outros para desenvolver as atividades com o aluno, já que os recursos utilizados nas aulas se encontravam disponíveis somente na escola, e a nomeei de “Caixa multissensorial”.
Antes das aulas, o aluno não reconhecia as cores, as formas, objetos iguais e diferentes, letras do seu nome, quantidade e, com o projeto, foram adquiridas e aperfeiçoadas competências relacionadas à alfabetização.
Para isso, construí atividades reutilizáveis a partir de materiais plastificados em que o aluno realiza e depois apaga para usá-la novamente em outro momento. Com foco na ludicidade, recorri a objetos concretos e atividades sensoriais, como o saco sensorial (atividade com um saco de gel, no qual a criança desenvolve a escrita de forma lúdica) e uma caixa de areia . Em outro momento, sugeri que fossem usados pregadores para estimular o movimento de pinça e aprimorar a coordenação motora fina.
Além dessas atividades foi construído um quadro de rotina diária com a mãe do aluno, para estabelecer a rotina do aluno e estimular a sua autonomia durante o seu dia.
Após montar a caixa, fui até à casa do aluno para fazer a entrega das atividades e obter uma maior aproximação com a família. Após a primeira entrega na residência, foram passadas instruções ao responsável para realização das atividades por videochamada. Com a mãe do aluno, foi criado um quadro para estabelecer uma rotina e estimular a autonomia durante o seu dia a dia.
Os encontros virtuais são realizados todos os dias e sempre no mesmo horário, contando com a presença do estudante, do responsável e da professora. A entrega de novas atividades acontecem mensalmente, de acordo com o desenvolvimento do aluno. Após esse momento, tem início um novo ciclo de aulas ao vivo.
Entre os resultados conquistados com esta ação, percebi que o engajamento da família aumentou consideravelmente. O atendimento individual, que muitas vezes não acontece em dias normais na escola, foi restabelecido com as aulas diárias por vídeo. Também vale destacar que a construção de materiais pedagógicos acessíveis específicos para as aulas ajudou muito no progresso do aprendizado do estudante.
Algumas habilidades que o aluno havia adquirido durante o início do ano regrediram com a falta das aulas presenciais. Porém, com o projeto, elas logo foram restabelecidas e também novas habilidades acabaram sendo adquiridas.
O projeto trouxe tantos ganhos positivos para a aprendizagem do aluno que vimos a possibilidade de continuá-lo no retorno das aulas presenciais. Dessa forma, possibilitaríamos a utilização do material por todos os estudantes, em trabalho colaborativo, apoiando o desenvolvimento de toda a turma.