A Casa de Ogum, como é conhecido o Okutá de Ògún, no Candeal, tradicional terreiro voltado ao culto do orixá guerreiro, foi tombado nesta segunda-feira (13), como patrimônio histórico de Salvador, pela Prefeitura, por meio da Fundação Gregório de Mattos (FGM). A cerimônia de assinatura dos documentos que garantem a salvaguarda do templo religioso foi comandada pelo prefeito Bruno Reis e contou com a presença da vice-prefeita, Ana Paula Matos, do presidente da FGM, Fernando Guerreiro, do compositor Carlinhos Brown e representantes do Okutá e outras lideranças religiosas da capital baiana.
O prefeito lembrou que a iniciativa acontece por meio de uma ação de reconhecimento realizada pela FGM, que já atuou em dois outros terreiros e na Pedra de Xangô. “Hoje estamos reconhecendo mais um patrimônio cultural de nossa cidade, com o tombamento da Casa de Ogum. Este já é o terceiro terreiro que nós tombamos em Salvador, assim como a Pedra de Xangô, em Cajazeiras, que é um símbolo da cultura de matriz africana em Salvador e o grande espaço de enaltecimento desta fé na cidade”.
O chefe do Executivo assegurou ainda que o tombamento vai permitir a preservação da casa bicentenária para as gerações futuras. “Este é um terreiro de forte influência para a formação desta comunidade, e o tombamento leva em conta essa importância, bem como as ações sociais na comunidade.
Processo – O processo de tombamento começou em 2019, por meio de solicitação formulada pela Associação Brasileira de Preservação da Cultura Afro Ameríndia (AFA). Para Dona Didi, de 103 anos e Mãe de Santo do templo religioso, esse é um grande momento para a Casa de Ogum. “Me sinto honrada de chegar a esta idade ainda à frente desse espaço tão valioso para todos nós. Tenho a felicidade de participar de um momento ímpar com a lucidez garantida por Deus e os orixás”.
Antes do Okuta de Ogum, a FGM já havia tombado outras duas casas de matriz africana: Ile Aşé Kalè Bokùn, em Plataforma, e Vodun Kwe To Zo, no Curuzu. Luzia Mangabeira, representando o Okuta, agradeceu pelo reconhecimento e lembrou que o tombamento da casa representa a força e a contribuição dos filhos de santo para a construção do país, e pela criação do bairro e a consequente manutenção e salvaguarda do terreiro.
Iniciando a fala com uma saudação ao orixá que rege o terreiro, o compositor Carlinhos Brown, oriundo do bairro e da casa de santo, aproveitou para falar da importância da resistência da cultura negra da Bahia. “Não temos que ir pelo caminho dos intolerantes, pois o Brasil foi edificado pelo povo negro, e hoje, com este terceiro tombamento, é mais uma forma de reerguer toda a dinastia africana que veio para a Bahia e o Brasil. É um acerto da Prefeitura. Então, que todos que verdadeiramente representam este povo sejam sempre respeitados. É uma honra fazer parte disso tudo que hoje acontece aqui”.
Histórico – Dentre suas particularidades, a Casa de Ògún é o único espaço de culto à divindade no Brasil, seguindo e mantendo os mesmos ritos como ocorre em África, onde cada região cultua uma divindade da diáspora africana. Essa é uma tradição bicentenária, implantada por uma princesa e sacerdotisa nigeriana, que foi responsável pela compra do terreno e da liberdade de um escravizado, com quem se casou.
Ambos realizaram o primeiro casamento na Igreja de Brotas e, ao oficializar a união no Brasil, passaram a ser chamados por Manoel Mendes e Josepha de Sant’Anna, conforme os ritos de batismo da Igreja Católica. Mendes, então, presenteou sua esposa com uma pedra – Okutá – que havia trazido de África. O objeto, que era do tamanho de uma semente de jaca primeiramente, vem crescendo ao longo do tempo.